[Pensa comigo] #2 - Os livros e as crianças

O que fazer para introduzir crianças na leitura?

Ontem foi dia das crianças e eu não poderia deixar de usar este momento especial para falar de um assunto que, pra mim, é extremamente relevante: a introdução das crianças na leitura.

Ainda me lembro com exatidão do dia em que li meu primeiro livro de verdade. Deitei no sofá da sala e abri o meu exemplar de "O mistério da fábrica de livros" de Pedro Bandeira, sem grandes pretensões, afinal, era só mais uma "tarefa chata da escola".

E de repente, em algumas horas eu não consegui fazer nada mais além de devorar aquele livro por completo.

Logo em seguida vieram Eu, Detetive de Stella Carr e, finalmente Harry Potter e a Câmara Secreta da J.K. Rowling, que me deixaram ainda mais apaixonado.

Após estes livros, simplesmente não consegui mais parar. A grande pergunta que me fiz então é: por que não descobri que ler era bom antes?

O LIVRO CERTO

A resposta é simples: minhas tentativas de leitura sempre empacavam nos clássicos. As pessoas insistiam tanto que eram 'bons livros' e 'leitura obrigatória' que era quase impossível não se sentir curioso. E de repente eu estava no meio de um monte de palavras sem entender quase nada.

Então a conclusão óbvia que veio à minha mente foi de que ler era uma atividade para pessoas diferenciadas pelo destino e não para simples mortais como eu.

A questão é que eu tive muita sorte por encontrar, a tempo, o livro certo para mim. Infelizmente, isso não acontece com todo mundo. Escolhas erradas geram traumas que podem nunca serem superados e simplesmente aniquilar um possível grande leitor.

E a ignorância literária de pais e professores sem dúvida é o maior responsável neste caso. Pessoas que usam a leitura como 'castigo' ou sugerem livros totalmente incoerentes com a 'idade literária' da criança não podem esperar que ele realmente goste de ler. E,olhando as estatísticas que temos de leitura no Brasil, é fácil se perguntar 'quem na verdade quer que as pessoas gostem de ler?". Se nem ao menos estes pais e professores gostam de ler, por que esperariam isso de uma criança? É uma realidade triste, mas que deve ser encarada de frente como um problema real.

No final das contas, a gente sabe que a paixão por livros não vai simplesmente brotar dentro da cabeça de alguém um belo dia só porque sim. Tudo começa com a leitura de um bom livro que o fará pensar: "hum, ler é bom: quero mais!".

O VALOR LITERÁRIO DOS LIVROS DE VALOR COMERCIAL

Paralelamente a isso, existe uma parcela da população leitora (felizmente cada vez menor) que continua a virar o rosto para os chamados livros comerciais. O argumento é simples: o que pode ensinar um livro criado com a preocupação em vender?

Antes da resposta a esta pergunta, vou citar um exemplo que torna essa preocupação mais palpável:

O livro: "Justin Bieber: uma biografia não autorizada" de Chas Newkey-Burden, basicamente conta a história de vida do referido cantor, que possui atualmente 19 anos. Obviamente, somado a outros livros semelhantes com o mesmo tema, vendeu uma grande quantia de exemplares, especialmente (ou quase exclusivamente) para as fans que o admiram.

Pode parecer polêmico ou controverso, mas acredito que qualquer tema que faça uma criança de 8 ou 9 anos ler sem parar um livro de mais de 300 páginas, merece ao menos um sorriso de triunfo. Por mais que, de fato, o conteúdo do livro não agregue praticamente nada à vida dessa pessoa, este livro introduziu uma pessoa a leitura e, com o amadurecimento natural, ela acabará procurando outros temas, talvez mais relevantes.

Acredito que, no fim das contas, livros como estes mais ajudam do que atrapalham na missão de 'formar leitores', assim como os gibis, mangás e as revistas infanto-juvenis. E por isso, se o objetivo é o letramento do indivíduo, é bastante ineficiente falar para a garotinha de 9 anos coisas como: "Pare de ler a biografia do Justin Bieber e vá ler Odisséia, que você aprenderá mais". Além disso é bastante rude! :)

Voltando à pergunta, o valor literário de um livro comercial como este citado é simplesmente o de contribuir para criar o hábito da leitura que, com o tempo e crescimento, a tornará mais crítica e a fará apreciar com muito mais sabedoria um Dom Casmurro.

É válido lembrar que valor literário e valor comercial não devem ser coisas opostas. Ora, se um escritor quer passar uma mensagem realmente relevante para o sociedade, por que não fazê-lo de maneira agradável para o leitor e com uma trama empolgante e envolvente? Fica a dica! ;)

É FÁCIL GOSTAR DE LER: É SÓ COMEÇAR!

E é justamente por conta do motivo acima que é tão fácil gostar de ler: existem livros sobre quase todos os temas (se não todos). O segredo para gostar de ler está em ler coisas que você gosta. Faz sentido?

Por isso, nunca é tarde para começar a se tornar um ávido leitor, entretanto, é muito mais fácil fazer isso quando se é uma criança, adaptável e receptiva às novidades que o mundo constantemente lhe apresenta.

Neste sentido, vou além da questão dos temas, mas das alternativas que o mundo moderno nos proporciona: ler em um tablet ou celular não é tão agradável para quem aprendeu a sentir peso, cheiro e sabor dos livros, mas para quem está começando agora certamente será uma opção natural, e assim deve ser.

No fim do dia, contribuir para que as crianças de hoje leiam mais certamente fará com que os homens e mulheres do futuro sejam também melhores leitores, o que poderia, de fato, representar uma mudança significativa no Brasil. Eu acredito, talvez ingenuamente demais, que a literatura é capaz de mudar os rumos de uma nação.

CONCLUSÃO

O que pretendia dizer com tudo isso era que tornar este um país que respeita e valoriza mais a literatura é mais fácil do que parece. Começa com uma atitude simples de ler para uma criança pequena ou presenteá-la com a obra ideal. Começa com mostrar que ela pode encontrar coisas de seu interesse nas páginas de um livro e que ler por prazer não é assim algo tão absurdo.

E que desse dia das crianças em diante possamos pensar um pouco mais sobre isso. Crianças são a promessa de um futuro melhor, mas só o serão verdadeiramente se os prepararmos para isso.

E você? Tem alguma história de introdução de crianças à literatura? Como você começou a gostar de ler?