[Pecados e Tragédias] #5 - Amor de chocolate (Parte 1)
- 110 quilos – Disse Eloah para a mãe, chorosa – Foi isso o que aquela balança idiota mostrou para mim.
E caiu em prantos.
A mãe, Joaquina, já esperava por isso e tinha uma resposta pronta. Segurando-a nos braços, ela proclamou:
- Você vai começar agora, querida, não dá mais para esperar. Você vai entrar em uma dieta rigorosa.
- Dieta? – Perguntou a mulher assombrada – Mas...
- Sem mas... já passou da hora. Você sabe que se não se cuidar, o seu namorado pode te largar e com certeza nenhum outro rapaz bom como ele vai te querer de novo.
A ofensa disfarçada de sabedoria atingiu o rosto de Eloah em cheio e serviu como motivação.
Ela se levantou e, com cara de quem se prepara para uma guerra, secou suas lágrimas e esbravejou decidida:
- Eu vou conseguir.
Satisfeita como nunca, a mãe bateu palmas e fez um novo alerta:
- Mas preste atenção em uma coisa: as influências negativas vão surgir em todo o lugar e as de casa são sempre as piores. Você vai entrar nessa dieta, mas o Gustavo precisa entrar também. Vocês precisam passar por isso juntos.
A filha bebia as palavras da mãe como se fossem água no deserto. Para ela, fazia muito sentido.
- Você vai entrar em uma academia e vai largar tudo de ruim: refrigerantes, sanduíches, pizza, cerveja, pastéis, chocolate...
Um sobressalto acompanhado de um gritinho exasperado.
- Não posso comer chocolate também?
Joaquina balançou a cabeça.
- Nem uma barrinha sequer.
E então Eloah sentou novamente e voltou a chorar.
Insegurança
Não se pode dizer que a situação ficara crítica do dia para a noite.
Desde muito pequena, Eloah já tomava sua mamadeira, uma, duas, três vezes e então pedia mais uma.
Na escola a hora do lanche era, de fato, a hora mais feliz. Levava uma lancheira abarrotada de tudo o que conseguia reunir em casa. E não dividia nada com os coleguinhas.
Quando completou seus treze anos já era a “gordinha da turma”, mas somente no penúltimo ano do ensino médio as provocações superaram o limite.
- Lá se vai a chupeta de baleia – Diziam quando ela passava.
- A rolha de poço – Falavam os outros.
- Já chegou o disco voador – Gritavam os menores.
E por aí continuavam: pudim de banha, planeta, pelota de arroz doce, pneu de trator, barril destampado, almôndega, lona de circo, montanha, leitoa, pança de todos, bola de canhão, quebra balanças, tonelada, jóquei de elefante e muitos outros.
Combinavam todos, em uma maldade coletiva, para que quando Eloah se sentasse, todos os outros pulassem da cadeira.
O bullying era pesado e isso abaixava a sua auto-estima a zero, o que só fazia com que ela comesse ainda mais.
Superada essa etapa infernal, ela entrou para a faculdade e finalmente conheceu Gustavo, o já mencionado namorado. Se apaixonaram logo de cara e começaram namorar em seguida.
Neste período da vida, a maldade sincera das crianças foi substituída pela falsidade social dos adultos, e, ao invés dos apelidos, comentavam em suas costas.
- Não acredito que o Gustavo está namorando a Baleia? – Comentavam as moças indignadas.
Contra tudo e todos, eles seguiram juntos e esperaram a formatura para enfim morarem juntos.
Entretanto, apesar de felizes, Eloah permanecia insegura. Foi ao médico e se pesou pela primeira vez depois de muitos anos.
O resultado a fez correr para a casa da mãe.
Continua em [Pecados e Tragédias] #5 - Amor de chocolate (Parte 2)
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